sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Qual é o seu motivo para se endividar?




Brasil já tem 80 milhões de pessoas com mais de uma dívida. Especialistas apontam questões emocionais como principal razão

Jornal Estado de Minas - 11/09/09

Depois de 10 anos de consumo compulsivo assumido, a advogada Maria Beatriz Tostes Barbi conseguiu mudar de vida. Há algum tempo ela vem controlando a vontade de comprar roupas, sapatos e bolsas. “No fundo, o impulso de comprar tudo o que se vê é uma coisa ruim, mostra que você está meio deprimida. É um negócio que, a princípio, parece que faz bem, mas depois a vida financeira fica toda bagunçada. A alegria da compra acaba te empurrando de volta para a depressão”, explica. A história de Maria Beatriz, que hoje comemora uma nova fase de vida, está longe de ser uma exceção no Brasil do crédito fácil. Segundo o Banco Central (BC), 80 milhões de brasileiros têm empréstimos bancários e cada consumidor mantém, em média, pelo menos três dívidas diferentes: financiamento da casa própria, do carro e outro tipo de empréstimo. As razões desse endividamento? Questões emocionais. Simples assim.
Segundo orientadores de finanças pessoais, como Mauro Halfeld, os problemas que levam as pessoas a exagerarem nas compras passam pela necessidade de gratificação imediata. Nesses casos, comprar dá prazer e acaba preenchendo vazios existenciais. Também é comum que o consumo seja usado como punição entre um casal, como forma de manter aparências sociais e até de disputar o amor dos filhos. O acúmulo de dívidas chega a cumprir estranhos papéis dentro do universo familiar, garante a psicoterapeuta Cláudia Prates. “Os empréstimos podem funcionar como ponte para a união entre a família. Há casamentos que só se mantém em função das dívidas. Às vezes, até os filhos entram na jogada. Existem famílias inteiras que se mantém unidas sobre esse pilar”, sustenta.
Para Maria Inês Prazeres, consultora de finanças pessoais, o pior do comportamento do comprador ou endividado contumaz é que ele não leva em consideração o custo real do que está adquirindo, mas sim os efeitos psicológicos imediatos da compra. A advogada L. E. C, que preferiu não se identificar, sabe bem o que é isso. Antes de se tornar independente, chegou a comprar uma joia no valor de um carro zero no cartão de crédito do pai. “Eu comprava roupas, joias e acessórios, sempre num valor maior do que o permitido”, reconhece. Hoje, dona do próprio nariz, mantém as contas em dia e não exagera no consumo. Admite, porém, que, ao consumir descontroladamente, era “levada pela carência”.
A psicóloga, S.R.V, que também pediu para não ter o seu nome revelado, atravessa uma fase intermediária entre as conquistas já obtidas pelas duas advogadas. Ela procurou uma consultoria de finanças pessoais que a ajudasse a planejar melhor as contas. Espera o resultado em seis meses. Por enquanto, está pagando as dívidas que fez para redecorar todo o apartamento, com direito à contratação de um decorador. “Adquiri quatro camas de solteiro para os meus filhos, além de novos computadores e escrivaninhas. Os gastos maiores foram parcelados”, afirma. O endividamento, porém, começou a ameaçar a saúde financeira da família. “Meu marido concordou com parte dos gastos, mas como está apertado, acha que eu deveria segurar mais um pouco“, assume. Ela reconhece que, “às vezes”, compra por impulso ou movida por insatisfações pessoais, mas não se considera uma consumidora compulsiva.
Segundo Cláudia Prates, muitos dos pacientes que procuram seu consultório são pessoas que querem saber os motivos que as levam a administra mal suas contas pessoais. “Elas querem entender por que gastam mais do que ganham, por que vivem penduradas em empréstimos em bancos”, conta. O problema é tão grave que a saúde financeira já é um tema que preocupa prefeituras do interior do estado. Maria Inês começa a levar esse conceito a cidades como Barbacena, São João del Rei e Teófilo Otoni. “Trabalho também com seguros e percebi que o orçamento dos funcionários públicos está seriamente comprometido. São pessoas de todas as classes sociais, que encontram na facilidade do crédito uma fuga para sua fragilidade emocional”, diz.
NOVAS DÍVIDAS O número de registros junto ao SPC da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH) apresentou queda de 7,32% em agosto na comparação com o mês anterior. Para Luis Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da consultoria Austin Rating, o fato indica que novas dívidas poderão ser feitas até o fim do ano. “Aqueles que se embolaram por causa da crise terão que tomar novos empréstimos, e de pior qualidade, para saldar seus compromissos”, avisa. Quem conseguiu escapar ileso da turbulência, também deverá s endividar, em curto, médio e longo prazos, acredita.

CLASSE MÉDIA EM EXPANSÃO A crise econômica não interrompeu o processo de expansão da classe média, segundo estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) divulgado ontem. A população economicamente ativa incluída na chamada classe C (com renda domiciliar de R$ 1,1 mil a R$ 4,8 mil) representava, em julho, 53,20% do total, crescimento de 2,5% sobre julho de 2008. A classe AB (renda superior a R$ 4,8 mil) teve retração de 0,5%, representando 14,97% da população. A classe D (de R$ 804 a R$ 1,1 mil) diminuiu 4,1% e a classe E (inferior a R$ 804) apresentou recuo de 3,3%.




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